“Preto, pobre e gay é tratado nesse país como animal de abate”, diz amigo de bailarino assassinado
Amigos e parentes de Reinaldo Pepe dos Santos, 40 anos, já estavam acostumados a aplaudir o bailarino. O reconhecimento como artista e o fato de ser considerado exemplo entre os amigos puxavam a saudação. Ontem, porém, quando ele foi velado e sepultado, no Cemitério Campo Santo, na Federação – depois dos aplausos e quando o artista saiu de cena -, tristeza e a revolta assumiram a sua marcação no palco.
Para José Carlos Santos, o Zebrinha, 60, essa era uma tragédia anunciada. “Preto, pobre e gay é tratado nesse país como animal de abate. Está aí à disposição para ser abatido a qualquer hora. É muito mais caro o quilo de uma galinha Avipal do que a vida de um preto, pobre e gay”, afirmou, revoltado, o diretor artístico do prestigiado Balé Folclórico da Bahia (BFB), do qual Nado (como Reinaldo era conhecido) era solista, ou seja, uma estrela da companhia.
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Quem conhecia Nado o descrevia como um homem forte, cheio de vitalidade. Por isso, foi uma surpresa a notícia de sua morte, na madrugada de domingo, em casa, no bairro da Saúde, por um homem ainda não identificado. “A gente não consegue ver aquele homem forte sendo morto. Dizem que a casa estava cheia de sangue para todos os lados. Ele certamente lutou muito”, afirmou Vavá Botelho, diretor do BFB.
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Centenas de pessoas foram ao Cemitério Campo Santo se despedir do bailarino Reinaldo Pepe Santos, 40, ontem. A maior parte das pessoas estava vestida de branco, como forma de pedir paz e, também, por uma tradição religiosa, já que Nado era adepto do candomblé. O sepultamento foi marcado pelas manifestações e cânticos em línguas africanas. “Ele era de Xangô e tinha muito orgulho disso”, afirmou Zebrinha, amigo e colega de trabalho.
Antes, houve músicas românticas e cristãs durante o velório. O ator Jorge Washington, do Bando de Teatro Olodum, foi ao sepultamento. Ele conta que apesar de não ter sido amigo de Reinaldo, o reconhecia de longe pelo profissionalismo. “Chega de tanta violência. Não dá nem para chamar de animal um sujeito que faz isso com um ser humano tão encantador”, declarou. A mãe de Nado, Edna Edvirgens Pepe, 72, acompanhou a cerimônia amparada pelos parentes.
“Eu só quero que haja justiça”, afirmou ela durante o sepultamento. O caso é investigado pela 3ª Delegacia de Homicídios (BTS). Ontem, o CORREIO não conseguiu contato com o delegado Guilherme Machado, responsável pela apuração.
A assessoria de imprensa do órgão informou que há depoimentos agendados para hoje e que, desde ontem, há equipes na rua levantando informações. Para a polícia, Nado saiu de uma boate no Pelourinho com o suspeito no sábado. Naquela noite, ele havia se apresentado no Teatro Miguel Santana e, segundo amigos, teria desistido de sair com amigos para uma boate por causa de dores na panturrilha, e avisou que ia para casa.
Segundo a irmã Ruth, ele se mudou de Castelo Branco por conta dos ensaios. “Ele disse a mainha que ficaria nessa casa por seis meses por causa dos horários do ensaio; que estava ruim de voltar para casa”, explicou. Nado se preparava para se apresentar em maio em uma turnê em Nova York, nos EUA.
Há suspeita de que o autor era conhecido da vítima, embora a família afirme não ter conhecimento sobre sua vida íntima. “Os vizinhos dizem que (o autor) era uma pessoa que, pelo menos na última semana, foi vista lá umas três vezes”, afirma Vavá. Nado foi morto a facadas. No local do crime havia sinais de luta corporal, segundo a polícia. Ele foi atingido no abdômen e no pescoço e quase foi degolado.
Policiais afirmaram que um suspeito havia sido identificado em Dias D’Ávila, na Região Metropolitana, e que equipes da Polícia Civil estavam fazendo diligências na cidade.
Publicada no dia 17 de março, às 14h29